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COCAÍNA
(PASTA DE COCA; CRACK; MERLA)
Definição e histórico
A cocaína é uma substância natural, extraída das
folhas de uma planta que ocorre exclusivamente na América do Sul: a Erythroxylon
coca, conhecida como coca ou epadú, este último nome dado pelos
índios brasileiros. A cocaína pode chegar até o consumidor sob a forma de um sal, o
cloridrato de cocaína, o "pó", "farinha", "neve" ou
"branquinha" que é solúvel em água e, portanto, serve para ser aspirado
("cafungado") ou dissolvido em água para uso endovenoso ("pelos
canos"); ou sob a forma de uma base, o crack que é pouco solúvel em água
mas que se volatiliza quando aquecida e, portanto, é fumada em "cachimbos".
Também sob a forma base, a merla (mela, mel ou melado)
preparada de forma diferente do crack, também é fumada. Enquanto o crack ganhou
popularidade em São Paulo, Brasília foi a cidade vítima da merla. De fato, pesquisa
recente mostra que mais de 50% dos usuários de drogas da nossa Capital Federal fazem uso
de merla e apenas 2% de crack.
Por apresentar um aspecto de "pedra" no caso do
crack e "pasta" no caso da merla, não podendo ser transformado num pó fino,
tanto o crack como a merla não podem ser aspirados como é o caso da cocaína pó
("farinha"), e por não serem solúveis em água também não podem ser
injetados. Por outro lado, para passar do estado sólido ao de vapor quando aquecido, o
crack necessita de uma temperatura relativamente baixa (95ºC) o mesmo ocorrendo com a
merla, ao passo que o "pó" necessita de 195ºC, por esse motivo que o crack e a
merla podem ser fumados e o "pó" não.
Há ainda a pasta de coca que é um produto
grosseiro, obtido das primeiras fases de separação de cocaína das folhas da planta
quando estas são tratadas com álcali, solvente orgânico como querosene ou gasolina e
ácido sulfúrico. Esta passta contém muitas impurezas tóxicas e é fumada em cigarros
chamados "basukos".
Antes de se conhecer e de se isolar cocaína da planta,
esta era muito usada sob forma de chá. Ainda hoje este chá é bastante comum em certos
países como Peru e Bolívia, sendo que neste primeiro é permitido por lei, havendo até
um órgão do Governo o "Instituto Peruano da Coca" que controla a qualidade das
folhas vendidas no comércio. Este chá é até sevido aos hóspedes nos hotéis. Acontece
que sob a forma de chá, pouca cocaína é extraída das folhas; além do mais, ingere-se
(toma-se pela boca) o tal chá, sendo pouca cocaína absorvida pelos intestinos que
começa a ser metabolizada pelo sangue e, indo ao fígado, é, em boa medida, destruída
antes de chegar ao cérebro. Em outras palavras quando a planta é ingerida sob a forma de
chá, muito pouca cocaína chega ao cérebro.
Todo mundo comenta que vivemos hoje em dia uma epidemia
de uso de cocaína, como se isto estivesse acontecendo pela primeira vez. Mesmo nos
Estados Unidos onde sem dúvida houve uma explosão de uso nestes últimos anos, já houve
fenômeno semelhante no passado. E no Brasil também há cerca de 60-70 anos utilizou-se
aqui muita cocaína. Tanto que o jornal O Estado de São Paulo publicava esta
notícia em 1914: "há hoje em nossa cidade muitos filhos de família cujo grande
prazer é tomar cocaína e deixar-se arrastar até aos declives mais perigosos deste
vício. Quando... atentam... é tarde demais para um recuo".
Efeitos no cérebro
Tanto o crack como a merla também são cocaína,
portanto todos os efeitos provocados pela cocaína também ocorrem com o crack e a merla.
Porém, a via de uso dessas duas formas (via pulmonar, já que ambos são fumados) faz
toda a diferença do crack e da merla com o "pó".
Assim que o crack e a merla são fumados alcançam o
pulmão, que é um órgão intensivamente vascularizado e com grande superfície, levando
a uma absorção instantânea. Através do pulmão, cai quase imediatamente na
circulação cerebral chegando rapidamente ao cérebro. Com isto, pela via pulmonar o
crack e a merla "encurtam" o caminho para chegar no cérebro, aparecendo os
efeitos da cocaína muito mais rápido do que outras vias. Em 10 a 15 segundos os
primeiros efeitos já ocorrem, enquanto que os efeitos após cheirar o "pó"
acontecem após 10 a 15 minutos e após a injeção, em 3 a 5 minutos. Essa
característica faz do crack uma droga "poderosa" do ponto de vista do usuário,
já que o prazer acontece quase que instantaneamente após uma "pipada".
Porém a duração dos efeitos do crack é muito rápida.
Em média duram em torno de 5 minutos, enquanto que após injetar ou cheirar, em torno de
20 e 45 minutos, respectivamente. Essa pouca duração dos efeitos faz com que o usuário
volte a utilizar a droga com mais freqüência que as outras vias (praticamente de 5 em 5
minutos) levando-o à dependência muito mais rapidamente que os usuários da cocaína por
outras vias (nasal, endovenosa).
Logo após a "pipada" o usuário sente uma
sensação de grande prazer, intensa euforia e poder. É tão agradável, que logo após o
desaparecimento desse efeito (e isso ocorre muito rapidamente, em 5min), ele volta a usar
a droga, fazendo isso inúmeras vezes até acabar todo o estoque que possui ou o dinheiro
para consegui-lo. A essa compulsão para utilizar a droga repetidamente, dá-se o nome
popular de "fissura" que é uma vontade incontrolável de sentir os efeitos de
"prazer" que a droga provoca. A "fissura" no caso do crack e merla é
avassaladora, já que os efeitos da droga são muito rápidos e intensos.
Além desse "prazer" indescritível, que muitos
comparam a um orgasmo, o crack e a merla também provocam um estado de excitação,
hiperatividade, insônia, perda de sensação do cansaço, falta de apetite. Este último
efeito é muito característico do usuário de crack e merla. Em menos de um mês ele
perde muito peso (8 a 10kg) e num tempo um pouco maior de uso ele perde todas as noções
básicas de higiene ficando com um aspecto deplorável. Por essas características os
usuários de crack (craqueros) ou de merla são facilmente identificados.
Após ao uso intenso e repetitivo o usuário experimenta
sensações muito desagradáveis como cansaço e intensa depressão.
Efeitos tóxicos
A tendência do usuário é aumentar a dose de uso na
tentativa de sentir efeitos mais intensos. Porém essas quantidades maiores acabam por
levar o usuário a comportamento violento, irritabilidade, tremores e atitudes bizarras
devido ao aparecimento de paranóia (chamada entre eles de "nóia"). Esse efeito
provoca um grande medo nos craqueros, que passam a vigiar o local onde estão usando a
droga e passam a ter uma grande desconfiança uns dos outros o que acaba levando-os à
situações extremas de agressividade. Eventualmente podem ter alucinações e delírios.
A esse conjunto de sintomas dá-se o nome de "psicose cocaína". Além desses
sintomas descritos, o craquero e o usuário de merla perdem de forma muito marcante o
interesse sexual.
Efeitos sobre outras partes do corpo
Os efeitos são os mesmos provocados pela cocaína
utilizada por outras vias. Assim o crack e a merla podem produzir um aumento das pupilas
(midríase), afetando a visão que fica prejudicada, a chamada "visão borrada".
Ainda pode provocar dor no peito, contrações musculares, convulsões e até coma. Mas é
sobre o sistema cardiovascular que os efeitos são mais intensos. A pressão arterial pode
elevar-se e o coração pode bater muito mais rapidamente (taquicardia). Em casos extremos
chega a produzir uma parada do coração por fibrilação ventricular. A morte também
pode ocorrer devido a diminuição de atividade de centros cerebrais que controlam a
respiração.
O uso crônico da cocaína pode levar a uma degeneração
irreversível dos músculos esqueléticos, chamada rabdomiólise.
Aspectos gerais
É certo que os usuários de cocaína relatam que
aumentam a dose quer para sentir os mesmos efeitos quer para aumentá-los. De qualquer
maneira, considera-se hoje em dia que a cocaína induz tolerância, tanto que os manuais
psiquiátricos mais atuais já admitem a tolerância induzida pela cocaína, sendo que
mesma pode ser observada em todas as vias de administração.
Não há descrição convincente de uma síndrome de
abstinência quando a pessoa para de tomar cocaína abruptamente: ela não sente
dores pelo corpo, cólicas, náuseas, etc. O que ocorre é que essa pessoa pode ficar
tomada de grande "fissura" desejando tomar de novo para sentir os efeitos
agradáveis e não para diminuir ou abolir o sofrimento que ocorreria se realmente
houvesse uma síndrome de abstinência.
Usuários de drogas injetáveis e Aids
No Brasil, a cocaína é a droga mais utilizada pelos
usuários de drogas injetáveis (UDI). Muitas destas pessoas compartilham agulhas e
seringas, e se expõe ao contágio de várias doenças, entre elas as hepatites, a
malária, a dengue e a aids. Esta prática, inclusive, é hoje em dia o fator de risco
mais importante para a transmissão do HIV. Segundo dados do "Projeto Brasil",
estudo epidemiológico realizado entre 1995 e 1996 com 701 UDI, envolvendo vários centros
do país, e coordenado pelo Instituto de Estudos e Pesquisas em Aids de Santos (IEPAS), as
taxas de prevalência de infecção pelo HIV entre usuários de drogas injetáveis chegam
a 71% em Itajaí, 64% em Santos e 51% em Salvador. O uso de drogas injetáveis está
associado a cerca de 50% de todos os casos de aids nas regiões de São Paulo e Santa
Catarina. No âmbito nacional, 21,3% dos casos de aids registrados até maio de 1997,
refere-se a categoria de usuário de drogas injetáveis.
Fonte: Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas
Psicotrópicas - CEBRID |